o fim do mundo me acontece todo dia

Rafaela Cordeiro
2 min readMay 27, 2024

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quando eu tinha uns 12 anos morria de medo de as previsões do calendário maia serem verídicas. e se, de fato, o mundo acabasse em 12 de dezembro de 2012? o que seria do meu futuro se, no final, as ondas de um enorme tsunami alcançassem a cidade pacata onde eu morava? parecia a pior coisa que poderia acontecer na vida.

só que, também aos 12, minha avó faleceu. e doeu como se fosse um tsunami, varrendo tudo. eu ainda tinha uma casa, família, amigos, mas não tinha mais a presença constante dela. ainda assim, o tempo curou. ou transformou. depois do luto a dor vira outra coisa, assume uma cor mais bonita. aprendemos a conviver com a saudade de longe, como se fosse uma velha amiga. alguém ambientado, sempre presente.

mas esse texto não é sobre luto, não. é sobre a sensação de que sua vida está prestes a ser arruinada a qualquer momento. você se sente feliz e, então, fica com medo de não sentir aquilo de novo. o medo bate na porta ao aprender algo novo, ao andar de carro em rodovias agitadas, ao estar confortável. porque afinal, você precisa estar alerta. sempre.

ser ansioso é estar pronto para o desastre. é escrever na pele a canção que diz: “[…] estou aproveitando cada segundo antes que isso aqui vire uma tragédia.”. porque dar errado parece iminente. você sabe que não, mas parece, e isso é suficiente para deixar sua mente exausta e seu coração em chamas. em nosso sangue, as cinzas. na cabeça, só o vazio. e ninguém entende.

o tsunami pode não ter chego hoje, mas e amanhã? e se ele vier amanhã?

não existem lugares altos para onde correr.

talvez a água nos alcance, mesmo.

de que adianta o medo?

qual o preço da coragem?

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Rafaela Cordeiro
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